quarta-feira, 2 de maio de 2012

Sursum Corda


Olá, boa noite a todos. 
Estou começando hoje este blog que tem como maior objetivo partilhar um pouco das minhas idéias e experiências. Falo de experiências mas não sou tão velho assim, tenho hoje 32 anos e sou sacerdote católico. Desde muito cedo senti no coração o desejo de estar no seminário. Motivos? Tantos, por exemplo, o fato de ir às missas dominicais e de ver os seminaristas entrando vestidos de branco me dava a impressão que aquilo ali era um pedacindo do céu. Tudo que me impressionava na Igreja era totalmente humano: as vestes, o turíbulo, o incenso a trepidar no carvão em brasas, a fumaça a subir, o perfume esparramado no ar, as velas sobre o altar, os paramentos do bispo e suas belas mitras mirando para o céu, as cores litúrgicas que a cada dia me indicavam o motivo celebrativo mas já se antecipavam ao dizer-me que uma grande festa se aproximava e que no outro dia sempre seria melhor.
Hoje eu consigo entender que o meu chamado não foi transcendental, como o é na maioria dos casos, mas foi humano. Em tudo isso eu sentia um Deus humano chamando um mísero ser humano para uma aventura de amor. Digo aventura justamente por não saber o que viveria no seminário. Só sabia uma coisa, por meio de tudo aquilo que era humano Deus me chamava a uma realidade que superava a minha inteligência, a minha vontade e a minha própria humanidade. Deus me chamava a experimentar um pouco do céu estando aqui, ainda na terra.
Desculpe-me se pareço poético demais, mas a primeira experiência de Deus é sempre arrebatadora, sobretudo para um adolescente que vivia no interior e que tinha como principal atração a Igreja. Mas era assim que eu me sentia. Impelido a dar uma resposta a este suposto chamado Divino que se exprimia através de realidades humanas.
Eu tinha na frente da minha casa um amigo que havia ido para o seminário e as histórias que a mãe dele nos contava, de aventuras nos longos corredores, de orações, de partilha nos momentos das refeições, tudo isso me fascinava. Me fascinava ainda quando eu entrava no quarto deste jovem na casa dos pais dele e tudo ali, parecia ser de Deus. A estantezinha de madeira com livros católicos, algumas imagens de santos, terços, ou seja, tudo ali falava-me silenciosamente de Deus. De um Deus que eu já conhecia ao participar das santas missas dominicais, mas de um Deus que eu desejava profundamente experimentar. Na verdade eu trazia no meu coração um profundo desejo de ser de Deus, de mergulhar em Deus. 
Minha infância e adolescência nem sempre foram só sonhos. Existiu realidades tristes, dificuldades, crises pessoais de um pré-adolescente, e até mesmo situações de pecado, mas como eu não tinha a consciência desta realidade de distanciamento que o pecado causa entre nós e Deus, logo, eu dava seguimento à minha vida e projetos, sonhado em ser santo. Eu só não sabia que com o passar dos tempos era Ela, a santidade, que sonharia comigo.
Hoje, como ser humano e como sacerdote, tenho plena consciência de que o pior mau que o pecado gera em nós é o distanciamento de Deus. Não que Deus nos evite após o pecado, mas nós O evitamos. A imagem em Gênesis 3,8 é clara. O esconder de Adão e Eva - que estavam nus - ao ouvir o farfalhar das folhas com os passos de Deus no jardim é a imagem perfeita do que acontece com o ser humano em situação de pecado. Isto é, esconde-se de Deus. E o esconder é justamente uma situação de fuga e de vergonha que exprime a nudez daqueles que tinham a graça diante dos olhos do Criador mas agora se sentem imundos e na desgraça. É justamente por isso que a nudez é expressão desta graça perdida. Mas como tudo que é perdido, pode um dia ser reencontrado, logo, com a graça de Deus não é diferente. Quando nos abrimos a ela gratuitamente e nos propomos através da oração diária, da Eucaristia e da escuta da Palavra de Deus a reconstruir o elo rompido, Deus, na sua infinita misericórdia, vem ao nosso encontro e nos restaura. Eis aqui o grande Dom de Deus, desejar sempre recriar. Não é por menos que no Gênesis vemos logo no capítulo 1, um Deus Criador. Portanto, se Ele cria é porque constrói, se constrói, logo, reconstrói e sendo assim, sempre está disposto a nos refazer em Suas entranhas de amor.
A título de esclarecimento. Porque escolhi como tema do meu blog a expressão latina da Santa Missa de São Pio V "Sursum Corda"? Eu o escolhi, primeiro, por que acho belíssima a melodia do canto; segundo, por que penso ser muito significativo o gesto simbólico que o sacerdote faz em ir, paulatinamente, erguendo as mãos do altar enquanto entoa o "sursum corda" e terceiro, porque trago sempre na minha  vida a certeza de que necessitamos a cada dia, ter os nossos corações no Alto. É difícil mantê-lo lá, até porque, humanamente falando, o lugar do coração é no peito, é na terra, é nas coisas do mundo, porque é com ele que mais enxergamos, mas religiosamente, é no céu que se encontra o seu limite. É em Deus que ele deve estar se não quisermos continuamente sucumbir ao peso de nossa cruz e de nossa miséria humana. Não é por menos que em cada liturgia o sacerdote convida: Sursum corda (...) Corações ao alto. Justamente para nos lembrar que nossas paixões não devem estar no mundo, mas no céu. Onde está Deus aí deve estar o nosso coração e se de fato nascemos para as coisas do alto, como afirmava São Paulo, logo, é no alto que deve estar o nosso coração. Pois quanto mais estivermos aqui em baixo, mais nos deixaremos seduzir pelas coisas do mundo. Por isso se faz necessário empreender, como na foto a cima, a cada dia, a nossa procissão para o alto e para isso precisamos sim, muitíssimo, do sacerdote que quotidianamente nos adverte: Corações ao alto! Avante! Para o céu!
Deus os abençoe.

Pe. Michel Rosa.


8 comentários:

  1. padre fico emocionado , em ver e ouvir o senhor falar de DEUS , o senhor tem o poder de transformar a vida das pessoas . Fico muito feliz em saber que DEUS consedeu a missao a um ser tao especial como o senhor é .... Que DEUS continue te abençoando e iluminando seu caminho.

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    1. João, só Deus tem o poder de transformar, nós, somos meros instrumentos, até dispensáveis, como diz a Sagrada Escritura, somos vasos de barro, mas Deus ainda quer contar conosco. Abraço.

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  2. Meu padre, sua bênção!

    Grato por esta iniciativa. Terás em mim um leitor fiel, atento ao teu pastoreio. Em troca ofereço as minhas preces.

    Obrigado!

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  3. Pe. Michel, parabéns pelo blog. Fico feliz pelo seu desempenho pastoral. Nunca tive dúvida disso. Que bom você estar,hoje, feliz!Deus queira que continue sempre assim. Um grande e fraterno abraço. Côn.Walter Caldeira-Cura da Catedral da Sé -SP

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    1. Caro Côn. Walter, meu amigo. Obrigado pelo carinho e amizade. Saiba que lhe sou grato por tudo que o senhor fez por mim e pelo trabalho que desempenhamos juntos em nossa querida Cristo Rei. Sinto saudades mas hoje consigo entender que, por mais que estejamos fisicamente separados, nossa missão continua a mesma. Mas o mais importante é que estamos unidos pela eucaristia. Grande abraço.

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  4. Paarabéns, Pe.Michel pelo blog. Que a luz do Espírito Santo ilumine sempre seu caminho para que prossigas nas trilhas do bem, que possas ser feliz e fazendo seres felizes.Que Deus derrame chuvas de bençãos sobre o Sr.PARABÉNS!
    Abraço com carinho.

    Rita

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    1. Olá Ritinha, Deus abençoe pelas palavras e amizade. Fique com Deus.

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